julho 10, 2011

a nossa história

Se estivesse ao teu lado agora, enchia-te de abraços e beijinhos e ficava a olhar-te durante horas. Aproveitava cada segundo do teu rosto e bebia a felicidade que exalava de ti. Deus fez-nos melhores amigas porque sabia que a nossa mãe não nos suportaria como irmãs.

E todas as amigas contam a verdade. Todas as amigas são honestas e cumprem promessas.

Vou contar-te uma história. Não é uma história bonita nem se pode dizer que é uma história triste. Ninguém a escreveu, senão estava abençoada com o poder das palavras e a feitiçaria da música, se esta fosse tocada.

Esta história aconteceu no meu coração. Este pedaço de carne que mal sobrevive sem bombear o amor para todas as válvulas. Não sei bem como começar.

Sei que vais perceber cada pedaço desta história porque me percebes e porque és metade de mim. A parte do meu coração que é Primavera e Verão. É assim que eu começo.

Quando entro na livraria subo ao andar de cima e aproximo-me da zona das crianças. Passeio pelos corredores da zona de leitura e não vejo ninguém sentado a ler. Então faço as vezes deles e sento-me num canto. Depois de ler as últimas linhas da última página, agradeço ao autor e cheiro a capa e as folhas do livro. Olho à volta e percebo que ninguém vagueia entre as prateleiras passando com o dedo pelos livros. Fico triste.

Desço ao andar de baixo e escolho um livro. Durante cinco minutos sento-me no sofá junto ao café da livraria e olho dentro das pessoas. Uma senhora que pega na chavena do café, um rapaz que procura incessantemente um livro de que gosta e uma menina pequenina junto à caixa registadora. E é aí que eu paro. Olho de novo. A senhora que estava sentada na mesa do café segura nas mãos uma carta da filha. Sorri como se não houvesse amanhã. Um gato branco rossa-lhe as pernas e mia pedindo atenção. Junto à secção dos romances o rapaz já não procura o livro. Apenas escolhe o mais bonito para guardar a carta da jovem que a vai ler quando o empregado lhe disser que um rapaz deixou algo para si.

A menina junto à caixa registadora olha para o tecto e por cima, lá bem por cima das luzes, ela estica o braço e pega no conjunto de balões que voam pelo imenso azul sem fim. Um coelho, uma raposa e um cachorro chamam-na e ela vai. Ela corre sem parar pela floresta e suja o vestido com o suco das cerejas que arrancou das árvores.

A última vez que pisquei os olhos já todos tinham saído. Acho que nunca estiveram lá. Não me importei muito. Acreditas que eles estiveram lá? Diz-me que sim. É que foi mesmo bonito e durante toda essa realidade que eu assisti, eu ouvi música sevelhana e vi mulheres bronzeadas a dançar. Era música sim." A expressão de um sentimento ou emoção." Simplesmente essa emoção era só minha. Se tivesse um pouco mais de força eles tinham estado mesmo lá e todos poderiam ver o que eu vi.

Nesta história é giro ter segredos. Quando saí da livraria fui conversar com Deus. Entrei na Igreja e não encontrei ninguém. Os bancos não estavam lá nem se ouvia o eco habitual do portal. Ele estava lá ao fundo. Ouvi-o muito baixinho mas consegui perceber tudo. Queres saber?

Ele disse-me que não faz mal ser diferente. Ele disse-me que os filhos nascem das mães e que quando um homem e uma mulher se amam, um filho nasce dos dois. Eu acho que nasci dos dois. Nasci num dia de Inverno e é por isso que gosto do frio. Gosto de ouvir as fagulhas na lareira.

Na minha história eu sento-me no café junto à estação do comboio e peço um café quentinho. Aqueles cafés que se chamam cappucinos. Na minha história, o rapaz que me serviu ao balcão guarda um caderno junto à máquina do cafe e faz retratos das pessoas que ele atende. Pedi-lhe para me mostrar. Ele hesitou. Eu não disse nada. Olhei à minha volta e apertei os lábios. Sorri-lhe e ele estendeu-me o caderno. Estava um pouco gasto do tempo mas ele disse-me que foi o pai dele que lho deu. Ele ja cá não está. Foi para junto dos Grandes. Ele desenha bem. Muito bem desenha ele a linha que cruza o labio superior do inferior e ali no canto do lábio. O beijo escondido.

Ele não me beijou nessa noite nem na noite seguinte. Quando o vento não bateu nas nossas caras eu perguntei-lhe se iria ser nesse momento que que nos beijávamos. Ele delicado fechou-me os olhos como se eu fosse uma criança à espera de um surpresa e beijou-me durante alguns segundos.

Mais tarde na minha história ele tinha nome. Tinha muitos nomes bonitos. Simples. Nomes saídos da terra. Ele nunca me desenhou.

A minha história não tem bem um fim. Dentro dela existem filhos. Os filhos que eu quis ter com o homem que eu amei. Fizémos amor e brincámos muito um com o outro e desse amor nasceram os nossos filhos.

Na minha história eu deixo-os correr e deixo-os apanharem vento nos pés. Achas que a brisa nos faz mal no inverno? Eu gosto de ouvir os grilos na noite e nunca me importei com o frio cortante da estação fria. É mais bonito quando temos alguém que nos aquece o corpo. Alguém que conhece o nosso corpo, as nossas marés e as nossas tempestades.

Quero contar-te muito esta história porque não sei bem como a contar. É uma história que anda por aí. Não tem pernas. Ela voa porque voar é muito mais divertido que andar de carro. Nesta história tu podes deitar as laranjas fora e mudar de vida. Tal como me tu ensinaste.

Quando chegar ao fim, não há fim. Porque quando leres as últimas linhas da última página vais perceber finalmente do que tudo se trata. Vais perceber que faz tudo sentido se acreditares que tudo tem mais potencial do que aquele que ninguém vê.

Nesta história eu falo com as árvores. Eu ouço os pássaros cantar e não me importo que chova. Na minha história existem almoços lá fora no jardim. Eu sou muito gulosa e ajudo a minha mãe nos cozinhados, mas ao menos nesta história ninguém se importa com o que eu como. Quando for hora de ir dormir eu vou falar com as lagartas e não tenho medo dos homens. Eu não as invejo porque não preciso de ter medo de quem nos é destinado.

Nesta história tu podes vestir o que quiseres. Nesta história nunca cresces portanto podes dizer disparates que toda a gente se vai rir e te vai dar um abraço de boas vindas. Nesta história tu podes amar tudo o que quiseres. Podes ser quem quiseres e podes ver o que mais ninguém vê. Portanto esta historia é tua.

Eu vivi-a para ti.


Não te esqueças de rebentar os balões na festa e de desmaiares de felicidade.


Um Feliz Aniversário da tua sempre e muito honesta amiga,



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